Por: Ricardo Rogers Mendonça Manciolli
Há homens que caminham entre nós com os pés na terra e os olhos fixos no céu. Francisco foi um desses.
Era, antes de tudo, um peregrino, um peregrino da alma.
Durante doze anos, ele nos guiou pelas veredas do espírito com a suavidade de quem sabe que o amor é a única bússola que realmente aponta o norte.
Nunca ergueu muros, preferiu pontes. E cada gesto seu, um abraço a um imigrante, uma lágrima silenciosa diante da dor dos pobres, uma palavra firme contra a destruição da natureza, era como uma página dos Evangelhos sendo lida diante de nossos olhos.
Francisco nos ensinou que rezar não é fugir do mundo, mas mergulhar nele com o coração cheio de compaixão.
O seu olhar cheio de bondade, sempre enxergava aquele que ninguém via. E talvez seja esse o maior sinal de sua grandeza: fez-se servo para relembrar ao mundo que o verdadeiro poder é o do amor.
Ele não caminhou sozinho. Levou o mundo consigo. Ensinou-nos que somos irmãos — Fratelli Tutti — e que essa irmandade exige mais do que palavras: exige cuidado, justiça, entrega.
Era março de 2013 quando o nome de Jorge Mario Bergoglio ecoou pela primeira vez da sacada do Vaticano. Um argentino, jesuíta, latino-americano “do fim do mundo”, como ele mesmo se apresentou.
Francisco falou dos presidiários, dos desprezados, criticou o capitalismo selvagem, pediu acolhimento aos refugiados, denunciou o desmatamento da Amazônia, e até ousou tocar em feridas que o catolicismo tradicional preferia esconder debaixo do tapete litúrgico.
No Brasil, Francisco virou um espinho. A extrema-direita católica, herdeira do moralismo inflexível e da saudade de uma cristandade idealizada, se contorceu a cada homilia papal. Rotulando como “comunista”, “globalista”, “traidor da fé”.
Agora que Francisco termina sua missão nesta terra, não o vemos partir, vemos sua luz espalhar-se. Como uma vela que, ao ser passada de mão em mão, acende outras. Seu legado não está num trono de ouro, mas no silêncio de cada prece sincera. Na coragem de quem ama até o fim.
Francisco é um espírito de alta hierarquia. Um daqueles que vem ao mundo de tempos em tempos para lembrar que o céu está logo ali, atrás do próximo gesto de bondade.
Barra do Garças-MT
27/04/2025
